quarta-feira, 28 de novembro de 2012

ANULAÇÃO DE REGISTRO DE FILHO POR VÍCIOS DE ERRO E FALSIDADE



FILIAÇAO. Anulação de paternidade. Recusa à realização do exame de DNA. Provas que afastam a presunção de paternidade
O reconhecimento de filho, uma vez comprovado o erro do registro, impõe anulação do ato quando não se comprove ter havido vínculo sócioafetivo entre as partes.

Como decidiu o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, invocando jurisprudência do STJ, se ficou comprovado – inclusive pelo exame de DNA – ter o autor registrado o menor como filho por acreditar na palavra da mãe da criança, vindo, posteriormente, a saber que era ele filho de outro, o reconhecimento da paternidade é anulável, nos termos do art.147, II, do C.C., já que em tal hipótese evidencia-se não haver efetiva relação de paternidade/filiação, demonstrativa de que o reconhecimento foi impulsionado por erro.
Tribunal Julgador: TJMG
Número do processo: 1.0079.09.924551-0/001(1) Númeração Única: 9245510-04.2009.8.13.0079
Relator: Des.(a) WANDER MAROTTA
Relator do Acórdão: Des.(a) WANDER MAROTTA
Data do Julgamento: 28/06/2011
Data da Publicação: 08/07/2011
Inteiro Teor:
EMENTA: ANULAÇÃO DE PATERNIDADE – RECUSA À REALIZAÇÃO DO EXAME DE DNA – PROVAS QUE AFASTAM A PRESUNÇÃO DE PATERNIDADE – ENTENDIMENTO SUMULADO PELO STJ, AUTORIZADO PELO ART. 232 DO NOVO C. CIVIL – ANULAÇÃO DO REGISTRO PÚBLICO, EM VIRTUDE DA EXCLUSÃO DA FILIAÇÃO – POSSIBILIDADE PELA EXISTÊNCIA INEQUÍVOCA DE ERRO. – O STJ cristalizou o entendimento de que a recusa do investigado em submeter-se a exame de DNA constitui prova desfavorável ao réu, pela presunção de que o resultado, se fosse realizado o teste, seria positivo em relação aos fatos narrados na inicial (art. 232 do CC). – Se ficou comprovado – inclusive pelo exame de DNA – ter o autor registrado o menor como filho por acreditar na palavra da mãe da criança, vindo, posteriormente, a saber que era ele filho de outro, o reconhecimento da paternidade é anulável, nos termos do art.147, II, do C.C., já que em tal hipótese evidencia-se não haver efetiva relação de paternidade/filiação, demonstrativa de que o reconhecimento foi impulsionado por erro.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0079.09.924551-0/001 – COMARCA DE CONTAGEM – APELANTE(S): R.V.M. REPRESENTADO(A)(S) P/ MÃE K.V.S.M. – APELADO(A)(S): J.M.J. – RELATOR: EXMO. SR. DES. WANDER MAROTTA
ACÓRDÃO 
(SEGREDO DE JUSTIÇA)
Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador WANDER MAROTTA , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO PARCIAL.
Belo Horizonte, 28 de junho de 2011.
DES. WANDER MAROTTA – Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. WANDER MAROTTA:
VOTO
Trata-se de apelação cível interposta por R.V.M., repdo pela mãe K.V.S.M., contra a r. sentença de fls. 86/88, que julgou procedente o pedido constante na ação negatória de reconhecimento de paternidade, c/c anulatória de registro civil, ajuizada por J.M.J., determinando a retificação do registro de nascimento da menor, com a exclusão do nome do autor, exonerando-o, em consequência, da obrigação de prestar alimentos a ré.
Sustenta a apelante que, embora o requerido tenha afirmado que o registro de nascimento foi realizado em virtude de erro e coação, em momento algum ficou comprovado o vício da vontade; o que houve, de fato, foi um auto-reconhecimento do autor como pai da criança, já que ele era ciente da traição. Assim, requer a improcedência de todos os pedidos ou a reforma da sentença para modificar o nome da criança para “R. V.”.
Conheço do recurso.
Afirma o autor que em outubro de 2007 foi informado pela genitora da menor de que ela o havia traído, estava grávida e iria praticar o aborto; dias depois foi procurado novamente pela mãe da criança que alegou haver mentido sobre a traição na tentativa de afastá-lo e por fim à gestação.
Assim, acreditando nesses argumentos, casaram-se em 7/12/2007, e, com nascimento da criança em 7/5/2008, o registro de nascimento foi efetivado em seu nome. Todavia, desconfiado de que não era o pai, acabou por realizar o exame de DNA em 8/1/2009, vindo a confirmar suas suspeitas.
Pretende que seja declarada a inexistência da paternidade com a alteração do registro de nascimento originário da criança.
O pedido é, em tese, perfeitamente cabível, dependendo, in concreto, das provas que se produzirem.
Leciona Mário Aguiar Moura:
“Se houve um reconhecimento que não corresponde à realidade, a lei deve admitir a faculdade de impugnação desse reconhecimento extravagante da verdade objetiva. O artigo 113 da Lei nº 6.015/73, dispõe que as questões de filiação legítima e ilegítima serão decididas em processo contencioso para anulação ou reforma do assento. A ação de impugnação de paternidade é ação de estado, como tal, inalienável, irrenunciável, inacessível e imprescritível. A falsidade da declaração jamais poderá convalescer porquanto é de interesse público que a filiação seja estabelecida segundo a verdade da filiação natural” (grifei – Tratado e Prática da Filiação, vol. I, págs. 164/167).
Assim, embora voluntário o reconhecimento da paternidade da ré pelo autor – em princípio irrevogável -, a meu sentir tal reconhecimento pode ser modificado, com fundamento na ocorrência comprovada de erro essencial. A boa-fé e a confiança depositada pelo apelado na afirmação da genitora da menor, de que esta era sua filha, levando-o a declarar o nascimento em registro e a obrigar-se pelos deveres oriundos da paternidade, se posto em confronto hoje, com o exame de DNA, no qual se nega a paternidade, caracteriza sem dúvida, o erro essencial no qual incorreu o apelado, previsto no art. 139 do novo Código Civil, atentando-se, ainda, a que o requerente/apelado era o namorado da mãe da criança por período coincidente com a época da concepção e nascimento.
Em relação à alegação da apelante de paternidade sócio-afetiva, não há como ser acolhida.
Apesar de espontâneo, o reconhecimento somente ocorreu em razão de equivocada interpretação da realidade. Caracteriza-se, assim, o erro do autor, tornando correta a decisão monocrática, que não desafia qualquer reparo. Não há demonstração válida de que houve uma “adoção à brasileira”, o que retiraria a hipótese de erro e poderia levar à manutenção do registro.
Ademais, o direito de a criança ver reconhecida a sua paternidade não se pode sobrepor à verdade dos fatos, nem devem os seus interesses estarem apoiados em teses falsas.
A chamada paternidade sócio-afetiva não pode ser imposta ao pai, ela deriva de sentimentos e do afeto que cresceu no dia-a-dia e na vida dos envolvidos, mas a Justiça, embora possa muito, não pode tudo, muito menos mudar a realidade.
Segundo definição de CLÓVIS BEVILAQUA, erro “… é a noção falsa, que vicia a manifestação de vontade” (Código Civil, vol. I, pág. 354). E, segundo CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA:
“Quando o agente, por desconhecimento ou falso conhecimento das circunstâncias, age de um modo que não seria a sua vontade, se conhecesse a verdadeira situação, diz-se que procedeu com erro” (Instituições de Direito Civil, vol. I, 3ª edição, pág. 304).
In casu, ficou constatado que o autor registrou a criança movido por um erro. Na ocasião, foi induzido pela mãe do menor a crer que era ele, realmente, o pai, embora, segundo o demonstra o exame de DNA (não desfeito por nenhuma outra prova), tal fato não corresponda à verdade. Assim, o reconhecimento é anulável, nos termos do art.147, II, do C.C.
Neste sentido:
“Na paternidade reconhecida, o pai concede status ao filho, que o seja biologicamente. Em contendo o ato uma proclamação de paternidade que não corresponde à realidade (o pai reconhece como seu um filho que o não é, o reconhecimento, embora formalmente perfeito, e até inspirado em pia causa, não pode produzir o efeito querido, e será anulado por falsidade ideológica, em se provando a inverdade da declaração. Juridicamente considerado, o reconhecimento é vinculado à veracidade da declaração. Esta vale, como confissão ou como declaração (Wissenserkläurung), no pressuposto de corresponder à verdade, e somente produzirá o efeito que a lei lhe atribuiu quando à manifestação formal corresponder o pressuposto fático da relação biológica paternal subjacente” (Caio Mário da Silva Pereira in “RECONHECIMENTO de PATERNIDADE e seus efeitos”, 3ª edição, pág. 75).
Mutatis mutanti, confira-se, também, os julgados de nossos Tribunais, colecionados no CD-ROOM JUIS e no site www.tjmg.gov.br:
“EMENTA:REGISTRO CIVIL. PATERNIDADE. FALSIDADE.
A ANULAÇÃO DO REGISTRO, EM VIRTUDE DE FALSIDADE IDEOLÓGICA, PODE SER PLEITEADA POR QUEM TENHA LEGÍTIMO INTERESSE ECONÔMICO OU MORAL. NÃO INCIDÊNCIA DO DISPOSTO NA SEGUNDA PARTE DO ART. 362 DO CÓDIGO CIVIL. LEGITIMIDADE DE QUEM PRETENDE O RECONHECIMENTO DE QUE É O VERDADEIRO PAI” (Superior Tribunal de Justiça – RESP 66691/RJ (199500254689) – j. 26/05/1997 – TERCEIRA TURMA – RELATOR: MINISTRO EDUARDO RIBEIRO – v.u).
“EMENTA: PATERNIDADE – ANTERIOR RECONHECIMENTO PELO INDIGITADO PAI – EXCLUSÃO DECORRENTE DE POSTERIOR EXAME DE DNA – Revela-se procedente a exclusão da PATERNIDADE, quando, posteriormente, por meio de exame de DNA, evidencia-se que não há efetiva relação de paternidade-filiação, demonstrativa de que o RECONHECIMENTO foi impulsionado por erro. Recurso desprovido” ( APELAÇÃO CÍVEL Nº 000.263.728-8/00 – COMARCA DE SENADOR FIRMINO – RELATOR: EXMO. SR. DES. LUCAS SÁVIO V. GOMES – v.u).
“EMENTA: Negatória de PATERNIDADE. Vício de vontade no RECONHECIMENTO de menor como filho. Procedência. Comprovando, o Autor, que, ao reconhecer criança como filho, o fez com vício de vontade, por não ter ciência de não ser o seu pai biológico, impõe-se o acolhimento do pedido de anulação do ato” (APELAÇÃO CÍVEL Nº 000.104.439-5/00 – COMARCA DE SETE LAGOAS – RELATOR: EXMO. SR. DES. PINHEIRO LAGO – SEGUNDA CÂMARA CÍVEL – j. 14 de setembro de 1999- v.u).
Pelos exposto, dou provimento parcial ao recurso apenas para determinar a modificação do nome da criança para R. V.
Sem custas.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): BELIZÁRIO DE LACERDA e PEIXOTO HENRIQUES.
SÚMULA : DERAM PROVIMENTO PARCIAL.

fonte:http://www.familiaesucessoes.com.br/?p=1405

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